Instituto Nascer

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A construção do cérebro humano começa no útero: a base da educação de uma nação

Muito antes da criança dizer sua primeira palavra ou segurar um lápis pela primeira vez, seu cérebro já passou por um processo intenso e decisivo de formação. Esse processo começa ainda na vida intrauterina e se intensifica nos primeiros anos após o nascimento. Essa fase — que compreende os Primeiros 1000 Dias de Vida (da concepção até os dois anos de idade) — é considerada pela ciência como uma janela de oportunidade única para moldar o futuro de um indivíduo e, consequentemente, de toda uma sociedade.

Educação começa no útero

Quando falamos em “educação”, o senso comum muitas vezes remete imediatamente à escola. Mas os pilares que sustentam a capacidade de aprender, de se relacionar, de lidar com emoções, de exercer empatia e de se autorregular, não são construídos no ambiente escolar. Eles são, na verdade, arquitetados no cérebro ainda em formação, em resposta direta aos estímulos, cuidados e interações recebidas desde a gestação.

Durante a vida intrauterina, o cérebro do feto forma cerca de 250.000 novos neurônios por minuto. Ao nascer, o bebê já tem aproximadamente 100 bilhões de neurônios, mas o que realmente importa é como esses neurônios se conectam — o que chamamos de sinaptogênese. A formação e o fortalecimento dessas conexões dependem fortemente da qualidade do ambiente intrauterino e das experiências sensoriais e emocionais da primeira infância.

Plasticidade cerebral e poda neural: usar ou perder

O cérebro infantil é altamente plástico — ou seja, tem uma capacidade extraordinária de se moldar em resposta aos estímulos. Essa plasticidade é uma vantagem evolutiva, pois permite ao bebê adaptar-se ao ambiente em que nasce. No entanto, ela também é uma vulnerabilidade: o que não é estimulado, é perdido.

Os circuitos neurais que não são usados com frequência são eliminados ao longo do tempo, em um processo chamado poda neural. Isso significa que as oportunidades perdidas nos primeiros anos dificilmente serão recuperadas integralmente depois.

Portanto, quando uma criança não recebe cuidado adequado, afeto, segurança emocional e oportunidades de interação, seu cérebro não alcança o pleno potencial de desenvolvimento. Isso afeta não apenas seu desempenho escolar no futuro, mas também sua saúde mental, sua imunidade, sua capacidade de trabalhar em equipe e de tomar decisões — ou seja, compromete aspectos essenciais da vida adulta.

O impacto na sociedade: saúde, aprendizado e cidadania

Já sabemos, por meio de estudos robustos em neurociência, epigenética e saúde pública, que investir nos primeiros 1000 dias gera retornos sociais, econômicos e de saúde extremamente relevantes.

Um ambiente intrauterino saudável — com nutrição adequada, ausência de estresse tóxico, cuidado pré-natal de qualidade e parto respeitoso — influencia o desenvolvimento cerebral, a formação do sistema imunológico, a regulação hormonal e até a expressão genética da criança.

Essa influência epigenética pode aumentar o risco ou a proteção contra doenças crônicas não transmissíveis na vida adulta, como obesidade, diabetes, hipertensão e transtornos psiquiátricos.

Além disso, crianças que tiveram uma primeira infância marcada por estabilidade, afeto e estímulos adequados, tendem a apresentar melhor desempenho escolar, menos evasão, maior empregabilidade e até menor envolvimento com a criminalidade.

Em outras palavras: o que acontece nos Primeiros 1000 Dias se reflete em toda a vida — e na sociedade como um todo.

Um novo paradigma de cuidado

No Instituto Nascer, defendemos um modelo de cuidado que reconhece a gestação, o parto e os primeiros anos de vida como a fundação do ser humano. Isso implica enxergar a educação como algo que começa antes mesmo do nascimento, e que depende de uma rede de apoio que envolva profissionais da saúde, famílias e políticas públicas.

Enquanto continuarmos tratando a infância apenas como uma fase preparatória para a “vida real” que começa na escola, estaremos ignorando as bases neurobiológicas que sustentam a própria capacidade de aprender e viver em sociedade.

Se queremos de fato construir um país mais justo, saudável e inteligente, precisamos começar pelo começo: no útero, no parto e na primeira infância. É aí que se forma — de verdade — o futuro de uma nação.

Hemmerson Henrique Magioni, Médico Obstetra, Fundador e Diretor Técnico do Instituto Nascer – CRM-MG 34455

Referências:

  • Black, M. M. et al. (2017). Early childhood development coming of age: science through the life course. The Lancet, 389(10064), 77–90.
  • Center on the Developing Child – Harvard University. Brain Architecture.
  • World Health Organization (WHO). (2020). Nurturing care for early childhood development: a framework for helping children survive and thrive to transform health and human potential.
  • Cochrane Pregnancy and Childbirth Group.
  • UpToDate. Neurodevelopment in the first 1000 days: Importance of early experiences.
  • National Scientific Council on the Developing Child. (2007). The timing and quality of early experiences combine to shape brain architecture: Working Paper No. 5.

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