Durante o pré-natal, uma das maiores preocupações de profissionais e famílias é garantir que o bebê esteja crescendo de forma saudável. No entanto, em alguns casos, a gestação pode evoluir com uma condição chamada Crescimento Intrauterino Restrito (CIUR) — uma situação que exige atenção, vigilância e cuidado multiprofissional. E não, CIUR não é sinônimo de cesariana, desde que o cuidado seja bem conduzido e baseado em evidências.
Vamos entender melhor o que é essa condição, como é feito o diagnóstico e qual é a melhor forma de cuidar de gestantes e bebês com esse desafio.
O que é o CIUR?
O CIUR é uma condição em que o bebê não está crescendo como o esperado dentro do útero, ficando com peso abaixo do percentil 10 para sua idade gestacional. Essa definição é feita com base em curvas de crescimento populacionais e, mais importante ainda, em avaliações individualizadas que consideram fatores maternos, placentários e fetais.
Importante: nem todo bebê pequeno é doente! Quando o bebê é pequeno mas saudável (o chamado pequeno para a idade gestacional – PIG constitucional), ele não apresenta sinais de sofrimento ou alterações circulatórias. Já no CIUR, o que está em jogo é um processo patológico que compromete o aporte de oxigênio e nutrientes, impactando diretamente o desenvolvimento fetal e aumentando o risco de complicações, inclusive morte fetal intraútero.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico do CIUR envolve uma combinação de exames e avaliação clínica:
- Avaliação da altura uterina no pré-natal — suspeita-se quando há desaceleração do crescimento.
- Ultrassonografias seriadas, com estimativa do peso fetal abaixo do percentil 10, em especial abaixo do percentil 3.
- Dopplerfluxometria obstétrica, avaliando os fluxos nas artérias uterinas, artéria umbilical, cerebral média e ducto venoso — fundamentais para classificar a gravidade do CIUR.
- Perfil Biofísico Fetal (PBF) e/ou cardiotocografia, que ajudam a avaliar o bem-estar fetal.
Quais são as principais causas?
O CIUR tem causas diversas, que podem se agrupar em três grandes grupos:
1. Fatores maternos:
- Hipertensão crônica ou pré-eclâmpsia
- Diabetes mal controlado
- Trombofilias e doenças autoimunes (como lúpus)
- Tabagismo
- Desnutrição materna severa
2. Fatores placentários:
- Insuficiência placentária
- Anomalias na implantação placentária
- Restrição vascular na circulação útero-placentária
3. Fatores fetais:
- Malformações congênitas
- Infecções intrauterinas (como citomegalovírus e toxoplasmose)
- Síndromes genéticas
Como deve ser o cuidado no pré-natal?
O pré-natal de uma gestante com diagnóstico de CIUR deve ser intensificado e feito por equipe especializada. Os pilares do cuidado incluem:
- Ultrassons seriados para monitorar o crescimento fetal e os Dopplers
- Avaliação da vitalidade fetal com PBF e/ou cardiotocografia
- Redução de intervalos entre consultas
- Repouso relativo (se indicado)
- Uso de aspirina em dose baixa (AAS 100mg/dia) nos casos em que o risco de insuficiência placentária foi identificado precocemente
- Suporte psicológico e emocional da mulher e do casal, com informação clara e acompanhamento multiprofissional
Quando e como interromper a gestação?
O momento da interrupção deve ser individualizado e baseado em três fatores principais:
- Gravidade da restrição (peso e Doppler)
- Idade gestacional
- Condições maternas e fetais
As diretrizes internacionais (ACOG, RCOG, NICE) recomendam:
- CIUR leve com Doppler normal: interromper entre 37 e 38+6 semanas
- CIUR com alterações do Doppler (ex: diástole zero ou reversa na umbilical): interrupção pode ser necessária entre 32 e 36 semanas
- CIUR com comprometimento grave (ducto venoso alterado, desacelerações no CTG): interromper mesmo com menos de 32 semanas, se necessário
A forma de interrupção também deve ser avaliada com cuidado:
- Via vaginal é possível e segura na maioria dos casos, desde que haja vigilância contínua do bem-estar fetal durante o trabalho de parto
- A cesariana deve ser reservada para situações específicas, como sofrimento fetal agudo, falha de indução ou condições obstétricas contraindicantes para parto vaginal
CIUR não é sinônimo de cesariana!
Muitos casais, ao receberem o diagnóstico de CIUR, acreditam que uma cesariana será inevitável. Isso não é verdade. O parto vaginal é seguro e desejável em muitos casos, desde que o bebê esteja bem, a indução seja feita com vigilância adequada e a equipe esteja preparada para agir diante de qualquer sinal de comprometimento fetal.
Na grande maioria das situações com CIUR leve ou moderado, a via de parto vaginal pode e deve ser tentada, respeitando as condições clínicas e os desejos da mulher.
Conclusão: ciência com cuidado é a chave
O diagnóstico de CIUR assusta — e com razão. Mas ciência, escuta e cuidado são os melhores aliados da saúde da mulher e do bebê. No Instituto Nascer, acreditamos em um modelo de assistência que combina o rigor da medicina baseada em evidências com o acolhimento, o respeito e o protagonismo da mulher.
Com acompanhamento atento e uma equipe preparada, é possível atravessar essa gestação com segurança, autonomia e confiança.
Se você ou alguém que você conhece está enfrentando esse diagnóstico, procure um serviço com experiência em cuidado multiprofissional e individualizado. Você não está sozinha. Nós estamos aqui.
Hemmerson Henrique Magioni, Médico Obstetra, Fundador e Diretor Técnico do Instituto Nascer – CRM-MG 3445
Fontes Científicas:
- ACOG Practice Bulletin No. 204 (2021). Fetal Growth Restriction
- RCOG Green-Top Guideline No. 31 (2023). The Small-for-Gestational-Age Fetus
- NICE Guideline NG207 (2021). Inducing Labour
- WHO Recommendations on Antenatal Care for a Positive Pregnancy Experience (2016)
- UpToDate. Fetal growth restriction: Evaluation and management
- Cochrane Database of Systematic Reviews – Induction of labor for suspected fetal growth restriction