Instituto Nascer

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Falha de Indução: quando o nascimento escolhe outro caminho

No Brasil, país das cesarianas desnecessárias, a falha de indução não costuma ser um problema — porque, na maioria das vezes, a indução sequer é tentada. O parto normal é frequentemente descartado antes de começar, e a cesariana marcada se impõe como solução simples, rápida e, aparentemente, inquestionável.

No entanto, há um movimento vivo e crescente de mulheres e profissionais que desejam resgatar a fisiologia, a dignidade e o tempo do nascimento. No contexto da humanização do parto, a indução é muitas vezes a ponte entre o desejo da mulher e a realidade clínica. E, quando essa ponte não leva ao destino esperado — o parto vaginal —, pode surgir um sentimento que nos inquieta: a frustração.

Mas será mesmo que houve uma falha?

O que é falha de indução do parto?

Do ponto de vista técnico, a falha de indução é definida como a incapacidade de estabelecer trabalho de parto ativo após a utilização adequada de métodos de indução, como prostaglandinas, ocitocina, métodos mecânicos e/ou amniotomia.

Segundo o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG), a indução pode ser considerada falha quando:

  • Após 24 horas de maturação cervical e estimulação adequada com ocitocina, não há dilatação cervical progressiva (geralmente até 4-6 cm)
  • Ou quando, após iniciar trabalho de parto ativo, há falência de progressão mesmo com contrações efetivas

É importante lembrar que não há consenso único, e a avaliação deve ser individualizada, levando em conta o bem-estar materno e fetal, a evolução do colo e o tempo total de estímulo.

Com que frequência a indução falha?

Estudos populacionais mostram que a taxa de falha de indução gira entre 15% e 30%, dependendo de fatores como:

  • Condições do colo no início (escore de Bishop ≤ 6 aumenta o risco)
  • Paridade (primíparas têm taxas maiores)
  • Indicação clínica (DMG, RCIU, pré-eclâmpsia, etc.)
  • Peso fetal estimado
  • Tempo e protocolo adotado
  • Experiência da equipe e disponibilidade de recursos

Em gestantes com diabetes mellitus gestacional em uso de insulina, por exemplo, a taxa de falha pode ser discretamente maior, principalmente se o colo estiver pouco favorável.

Por que a indução falha? Quais as causas?

A falha da indução do parto não é culpa da mulher, nem da equipe. É reflexo da complexidade do corpo e dos limites da intervenção sobre a fisiologia. As principais causas incluem:

  • Colo uterino imaturo ou pouco responsivo aos métodos aplicados
  • Padrão de contrações inefetivo, mesmo com ocitocina
  • Desproporção céfalo-pélvica real ou funcional
  • Fatores emocionais ou contextuais que afetam a progressão do parto
  • Papel do tempo e da variabilidade fisiológica individual

A indução é, por definição, uma tentativa de persuadir o corpo a entrar num processo que normalmente ocorre de forma espontânea. Quando ela falha, o corpo apenas está dizendo “ainda não” — ou “não assim”.

Quais os riscos de uma indução prolongada ou mal-sucedida?

A falha da indução, quando bem conduzida, não representa, por si só, um risco grave. Porém, tentar induzir por tempo excessivo ou sem critérios claros pode levar a:

  • Infecção intrauterina (corioamnionite)
  • Sofrimento fetal
  • Exaustão materna
  • Maior risco de parto traumático
  • Necessidade de cesariana emergencial em condições menos favoráveis

Por isso, a decisão de encerrar a indução com uma cesariana deve ser vista como um ato de sabedoria clínica, não de fracasso.

E quando, mesmo com todo cuidado, a indução “falha”?

Falha de indução. A palavra carrega peso. Como se algo tivesse dado errado. Como se alguém — o corpo, a mulher, a equipe — tivesse falhado.

Mas será mesmo?

No contexto de um cuidado baseado em evidências, onde houve escuta, respeito, acompanhamento contínuo e uso racional dos recursos, não existe falha — existe resposta. Existe um corpo que disse: “não agora, não assim”.

Essa cesariana não é a mesma daquela marcada por conveniência ou medo. Ela nasce de um caminho trilhado com coragem, com ciência e com presença. Ela é, muitas vezes, mais fisiológica do que a intervenção que se faz antes mesmo do parto começar.

Uma nova forma de olhar para a cesariana após tentativa de parto

A mulher que tentou indução com métodos seguros, que esperou, que se moveu, que acreditou… não falhou.

Ela reivindicou o seu direito ao parto respeitoso. E, quando o parto precisou de ajuda, ela também acolheu a cesariana como parte do cuidado.

Essa cesariana — feita após dias de escuta e presença — não é símbolo de derrota. É símbolo de entrega, de confiança, de vínculo com o próprio corpo e com o bebê. É uma cesariana com significado, e isso transforma tudo.

No Instituto Nascer, aprendemos todos os dias que não existe nascimento perfeito — existe o nascimento possível, vivido com consciência, respeito e amor.

E isso, por si só, já é uma grande vitória.

Hemmerson Henrique Magioni, Médico Obstetra, Fundador e Diretor Técnico do Instituto Nascer – CRM-MG 34455

📚 Fontes científicas utilizadas:

  • ACOG Practice Bulletin No. 107 – Induction of Labor (2019)
  • ACOG Committee Opinion No. 766 – Approaches to Limit Intervention During Labor and Birth (2019)
  • RCOG Green-top Guideline No. 70 – Induction of Labour (2021)
  • NICE Guideline CG70 – Inducing Labour (2021)
  • Cochrane Database of Systematic Reviews – Methods for cervical ripening and labour induction (2022)
  • WHO Recommendations on Induction of Labour (2011)

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